Há cinco anos, quando escrevi o artigo Estratégia para ler Nietzsche, não imaginava que teria a aceitação que teve de meu público.
De lá para cá, várias questões me foram levantadas a respeito dessa estratégia mental que formei para melhor compreender este filósofo tão controverso e tão mal compreendido da filosofia moderna.
Assim sendo, quando o tema é filosofia, quanto mais nos aprofundamos, maiores são os questionamentos que nos envolvem e raras são as respostas. E em Nietzsche essa proporção ganha uma escala imensa pois, para tentar compreendê-lo, precisamos desbravar caminhos tortuosos. E neste ponto é necessário ter um norte fixo em mente para não nos perdermos.
É preciso traçar um plano de vôo preciso. Digo isso pois pesquisei, a princípio, quais eram as leituras de cabeceira de Nietzsche, bem como seus filósofos preferidos, assim como os que ele citava como desprezíveis, sendo Sócrates, o grego aclamado pela sociedade Ocidental, um deles. Sem falar em Immanuel Kant.
Mas não pense você que apenas por Nietzsche rechaçar esses filósofos, não precisamos ter contato com seus trabalhos. Pelo contrário, são estes trabalhos que nos fazem entender a mente inquisidora de Nietzsche, que levanta pontos que passam batidos em uma leitura rasa e sem compreensão.
Seguindo esse caminho, um ponto se faz necessário. Deve-se buscar um entendimento profundo do que foi o Helenismo Grego e os seus reflexos. Por este motivo Nietzsche chega a afirmar que a verdadeira filosofia está no mundo pré-socrático.
Por conseguinte, é preciso um trato muito grande em relação ao pensamento nietzschiano. Não podemos ser rasos ao ler Nietzsche. Precisamos ir além de suas palavras.
Em seu livro "A Gaia Ciência", no capítulo intitulado "Brincadeira, Astúcia e Vingança - Prelúdio em rimas alemãs", Nietzsche nos traz sessenta e três aforismas que tocam em temas variados, e no aforisma 54 ele faz a seguinte afirmação:
"Bons dentes e bom estômago -
Eis o que lhe desejo!
Se der conta de meu livro,
Certamente se dará comigo!"
Não podemos ler Nietzsche apenas em busca de uma forma de autoajuda, ou até mesmo como a meta de achar soluções para nossos problemas pessoais. Nietzsche não é a autoajuda que conhecemos atualmente. Ele usa o martelo, ou melhor, a marreta, para nos levar para uma coisa muito maior e dinamitar nossa razão socrática. Ele nos chama a atenção para a tentativa do entendimento do que é o ser humano. E essa, meus caros, é uma explicação que atormenta o ser humano desde os tempos mais remotos.
Acredito que, neste momento, meus leitores podem perceber que o trato necessário para ter contato com Nietzsche é trabalhoso. Sim, trabalhoso porém necessário para encontrarmos o verdadeiro Nietzsche.
O Nietzsche que anseia e que expressa em seus escritos uma forma diferente de ver o mundo sem as amarras do molde socrático-platônico-cristão. Um exemplo claro disso é Zaratustra. Onde ele fala que só o amanhã a ele pertence. Na esperança de que gerações futuras venham a ter a sensibilidade para entender o que ele quis dizer.
Por este motivo, não podemos nos deter a ler os livros mais comentados de Nietzsche. Isso nos afastaria dele. Devemos conter nosso apetite e ler Zaratustra e O Anticristo depois de adentrar o universo de Nietzsche. Só assim teremos olhos e ouvidos para entender o que ele quis nos mostrar. Pois são leituras que nos chocam. São leituras muito fortes para pessoas que não estão previamente preparadas para o que ele quer nos mostrar.
Não afirmo aqui que sou totalmente favorável a tudo que Nietzsche nos coloca. Tenho meus pontos sensíveis, valores com os quais fui criada e que pesam... Mas Nietzsche trata disso de forma necessária. Porém, quando minha digestão mental vai além, dou um tempo e volto quando estou pronta.
Não pensem que em dezoito anos de estudos sobre Nietzsche eu não briguei com ele... Já cheguei a falar que nunca mais falaria com ele... Mas como toda paixão tem seus arroubos e momentos de questionamentos, voltei ainda mais apaixonada... Porém, como já disse anteriormente em outro artigo, minha paixão virou amor e as coisas estão mais calmas...
Entretanto, percebo que as pessoas mundo a fora amam Nietzsche por seus aforismas, mesmo que estes, em sua maioria, mostrem-se apenas como frases de efeito que fazem sentido apenas naquele momento, mas que fazem sentido de alguma forma.
Nietzsche tem esse poder de chamar a atenção de leigos. Entretanto, para continuar a tê-lo como mentor, é preciso muito trabalho. E é aí que muitos desistem. E só quem tem olhos, ouvidos e vontade de pesquisar e persistir nesse caminho para encontrá-lo, realmente dá início a essa caminhada sem fim.
Assim se faz essa vida caminhante da filosofia. Uma caminhada sem fim. Mas para quem acha seu norte é um caminho apaixonante e com tantos questionamentos que faltam vidas para chegarmos onde realmente queremos.
Por isso leitor, embarque nessa viagem. Garanto que você não se arrependerá de adquirir conhecimentos e valores que vão muito além do que nossa sociedade atual, medíocre, nos ensina. E que nos fazem apenas ruminar valores perdidos e sem sentido.
Até breve!!!
Cara Dayele
ResponderExcluirConcordo com vc. Sim , o caminho para entender Nietzsche é arduo. Como vc também tive momentos de me afastar dele, mas voltei ao mundo Nietzschiano com mais ardor. Penso que pra começar a entender Nietzsche é melhor començar por livros comentados por outro Filósofo especializado nele . Sugiro " Crepúsculo dos Idolos" livro esse comentado por um Filósofo da USP Sergio Krieger