sexta-feira, 4 de agosto de 2023

Nietzsche e Emerson

Este é o quarto artigo de uma série voltada a falar a respeito de personalidades que Nietzsche admirava. Vocês bem podem perceber que tratamos aqui de um grupo extremamente seleto, ao menos é o que ele deixa claro no livro "Crepúsculo dos Ídolos".

A personalidade que tratatrei no artigo de hoje é Emerson (Ralph Waldo Emerson), um estadunidense que foi poeta, conferencista, filósofo, orador, autor de ensaios e criador de uma filosofia transcendentalista.


A seu respeito, Nietzsche afirma: 

"13- Emerson - Muito mais esclarecido, errante, múltiplo, refinado
do que Carlyle, sobretudo mais feliz... Alguém que se nutre apenas
de ambrosia, que deixa de lado o que é indigesto nas coisas.
Comparado a Carlyle, um homem de gosto. - Carlyle que dele
muito gostava, dizia dele, porém: "não nos dá o suficiente para
morder": o que pode ser dito com justiça, mas não em detrimento
de Emerson. - Emerson tem a boa e espirituosa jovialidade que
desencoraja toda a seriedade; ele simplesmente não sabe o quão
velho já é e quão jovem ainda será - ele poderia dizer de si mesmo,
citando Lope de Vega: "yo me sucedo a mí mismo". Seu espírito
sempre acha motivos para estar satisfeito e até mesmo agradecido;
e às vezes roça a jovial transcedência daquele bom sujeito que voltou
de um encontro amoroso tanquam re bene [como de uma coisa bem
feita]. "Ut desint vires", disse agradecido, "tamen est voluptas" [Embora
faltem as forças, é de louvar a volúpia, no entanto]."

O ponto desta citação que me chama a atenção, é quando ele afirma: "ele não sabe o quão velho já é e o quão jovem ainda será", mas para que esta afirmação faça sentido a você leitor, vamos avançar um pouco no tempo para mostrar-mos os reflexos da filosfia transcedentalista de Emerson.

Emerson foi um dos grandes influenciadores filosóficos de dois movimentos norte americanos do século XX que vieram a influenciar todo o comportamento das gerações que as sucederam. Estou falando aqui do movimento "Beatnik", nas décadas de 40 e 50, e o movimento "Hippie" nas décadas de 60 e 70.

Podemos explicar o nome "beatnik" para esse movimento de duas formas. A primeira refere-se ao significado de "beat" que quer dizer rítmo ou batida, e estaria ligada com a influência do Jazz que estava muito forte neste momento. Já o sufixo "nik" está relacionado ao lançamento do satélite soviético Sputnik na década de 50. 

Já a segunda interpretação, está relacionada a um dos representantes desse movimento que foi Herbert Huncke, ele utilizava o termo no sentido de "cansado", ou seja, o cansaço da vida.

Quando paramos para analisar a sociedade estadunidense da década de 40, podemos ver que a geração beatnik estva inserida no contexto do pós Segunda Guerra Mundial e os Estados Unidos viviam uma euforia econômica que era refletida em um consumismo exacerbado. As pessoas envolvidas neste movimento criticavam o conformismo, a hipocrisia e a alienação de sua época. O comportamento do grupo em resposta a isso, era um estilo de vida simples, despreocupado e conviviam com pessoas com as quais tinham afinidades. Pregavam o sexo livre, o uso indiscriminado de álcool e drogas e andavam por quase todo o território do país. Entretanto, o movimento Beatnik foi marcado também por produções literárias e artísticas e ficou marcado na história como um forte movimento de contracultura e que veio pouco tempo depois a influenciar o outro movimento ao qual me referí acima, que é o movimento Hippie.

O movimento Hippie teve início na cidade de São Francisco (EUA) e tinha como objetivo o amor livre, o respeito à natureza, o pacifismo, uma vida simples e sem preocupações consumistas. 

Agora, retornando a Emerson, trarei uma citação dele que foi formulada após conhecer, em sua primeira viagem pela Europa em 1833, o "Jardim des Plantes", uma espécie de jardim botânico, e que foi responsável por uma mudança de pensamento muito forte nele. A citação diz o seguinte:
 
"A Natureza é uma língua, e cada novo facto
que aprendemos é uma nova palavra; mas
esta não é uma língua repartida em pedaço
 e morta num dicionário, mas antes uma língua construída
num sentido mais significativo e universal. Quero aprender
esta língua, não para conhecer uma nova gramática,
 mas para poder ler o grande livro que está escrito nesse idioma."

Emerson buscava entender a natureza e sua conexão com a transcendência no ser. Em sua época ele foi pouco compreendido, mas as gerações futuras, como os beatniks e os hippies, buscaram em sua filosofia uma forma de alicerçar a sua visão de mundo que era contrária ao que na prática acontecia na sociedade estadunidense da época.

Acredito que agora fica claro quando Nietzsche refere-se a Emerson como "não tendo a noção do quão velho estava e o quão jovem ainda seria". Pois bem, alguns anos depois, o pensamento de Emerson foi a base de um movimento criado por jovens, contra uma sociedade altamente consumista e que impunha um grande não à todas as pulsões dos ser. 

Por mais que os movimentos de contracultura choquem a sociedade, eles são necessários pois expressam todas as amarras que prendem a sociedade a um estado moral que gera uma forma de cláustro nas pessoas, sem dinamismo, sem andamento, sem liberdade de ideias e de questionamentos. 

Lembrando aqui que esses movimentos tem sim seus exageros, como o uso de drogas exacerbado, contudo, são em momentos assim que a arte é expressa plenamente, seja por meio da música, da literatura, da poesia ou da pintura. Os movimentos de contracultura, de certa forma, servem para que seja feita uma forma de "up-grade" na sociedade, deixando os mortos no lugar dos mortos e os vivos para agirem plenamente.

Eis aqui a jovialidade de Emerson aos olhos de Nietzsche.

Até breve!

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