sexta-feira, 18 de agosto de 2023

Filosofia e Psicanálise

Quem conhece este blog sabe que tenho como meta trazer o pensamento de Nietzsche para os dias atuais. Confesso que a cada dia fico mais pensativa em relação à leitura que Nietzsche realizou de toda a história do pensamento ocidental. 

Questionamentos sempre me vêem à mente, do tipo: O que fazer com essa perspectiva? Ou, como agir entendendo que tudo o que é não vem a ser? Pois bem, foram questionamentos como estes que me fizeram mergulhar no mundo da Psicanálise. 

Compreeder o ser humano em sua totalidade é uma meta buscada há milênios pela Filosofia. E talvez por isso ela me chame a atenção de maneira tão forte. E não foi nada diferente quando iniciei meus estudos em Psicanálise.

Em essência, a dinâmica da terapia psicanalítica envolve a análise pessoal, de forma que a pessoa passa a olhar para si profundamente, desde seus primórdios (infância) até a vida adulta. E assim acaba por localizar pontos não resolvidos que refletem comportamentos disfuncionais no hoje. Por isso o processo psicanalítico é lento e gradual, pois quem determina esse tempo é o próprio analisando. Conforme ele vai mergulhando em si e vai se ouvindo, tem início sua reflexão. 

Sigmund Freud, o pai da Psicanálise, foi o primeiro a pensar o inconsciente como fundamento dos processos psíquicos. Em seu texto "Uma dificuldade da Psicanálise [1917]", Freud apresenta de forma muito bem explicativa o que é a Psicanálise e a que veio. (Indico a leitura deste texto para quem deseja entender os princípios da Psicanálise direto da fonte que a criou).

Importante pontuar o que Freud descreve a respeito de sua Teoria da Libido:

"O que procurei delinear com essas indicações é a teoria libidinal das neuroses, sobre a qual se baseiam todas as nossas concepções acerca da natureza desses estados patológicos e o nosso procedimento terapêutico para combatê-los. É claro que também consideramos válidos os pressupostos da teoria da libido para o comportamento normal. Falamos de narcisismo do bebê e atribuímos ao intenso narcisismo do homem primitivo o fato de ele crer na onipotência de seus pensamentos e de querer influir no curso dos eventos do mundo mediante a técnica da magia".

É a partir da explanação sobre a essência da clínica psicanalítica que Freud fala a respeito do que ele nomeou como as "três duras afrontas" por parte da pesquisa científica em relação à humanidade. A respeito disso, o filósofo esloveno Slavoj Žižek em seu livro "Como ler Lacan", diz o seguinte:

"Freud desenvolveu a ideia de três humilhações sucessivas sofridas pelo homem, as três “doenças narcísicas” como as chamou. Primeiro Copérnico demonstrou que a Terra gira em torno do Sol, e assim privou-nos a nós, seres humanos, do lugar central no Universo. Depois Darwin demonstrou que emergimos da evolução cega, e nos tomou nosso lugar de honra entre os seres vivos. Finalmente, quando Freud descobriu o papel predominante do insconciente em processos psíquicos, revelou-se que nosso eu não manda nem mesmo em sua própria casa".

Freud foi incisivo em sua afirmação, principalmente no que diz respeito ao sujeito não controlar nem mesmo sua própria "casa", ou seja:

"Em determinadas doenças, e justamente nas neuroses que estudamos, as coisas são diferentes. O Eu se sente mal, depara com limites a seu poder em sua própria casa, a psique. De repente surgem pensamentos que não se sabe de onde vêm; tampouco se tem como expulsá-los. Esses hóspedes desconhecidos parecem até mais poderosos do que os submetidos ao Eu; resistem a todos os meios coercivos da vontade, aprovados em muitas ocasiões, e permanecem imperturbados ante a refutação lógica, indiferentes ao desmentido da realidade. Ou ocorrem impulsos que parecem os de outro indivíduo, de modo que o Eu os renega, mas tem de receá-los e tomar precauções contra eles. O Eu diz a si mesmo que se trata de uma doença, uma invasão estrangeira, e aumenta a vigilância, mas não pode entender por que se sente paralisado de maneira tão estranha".

(Obs: Na tradução da Companhia das Letras, o tradutor Paulo César de Souza, usa "Eu" e não "Ego").

Ao final do texto, Freud afirma que não foi a Psicanálise quem deu o primeiro passo no sentido do inconsciente. E que sim, filósofos de renome é que foram os precursores nesse sentido, e cita Arthur Shopenhauer como exemplo:

"Filósofos de renome podem ser citados como precursores, sobretudo o grande pensador Schopenhauer, cuja “vontade” inconsciente se equipara aos instintos da mente na psicanálise. É o mesmo pensador, aliás, que lembrou aos homens, em palavras de impressão inesquecível, a sempre subestimada relevância de seus impulsos sexuais". 

A intersecção entre Filosofia e Psicanálise é uma realidade, pois ao serem unidas, quem ganha é a individualidade do ser. 

Ao meu ver a Psicanálise veio como uma formidável ferramenta que conecta o ser com a Filosofia. Mas o que a Psicanálise nos mostra é que apenas a pessoa, o analisando (a), pode trilhar esse caminho de conhecimento pessoal e assim educar-se emocionalmente para lidar mais facilmente com seus problemas cotidianos. 

Infelizmente a maioria das pessoas não tem noção de si, vive sua vida em função dos outros ou aguardam uma melhora para sua vida  que seja externa. Apelando assim ou para remédios ou para a religião. Em ambos os casos, vejo como processos paliativos e que mais cedo ou mais tarde, permitem que voltem todos os seus sintomas. 

A Psicanálise é um processo investigativo do ser por ele mesmo e tem como mediador um psicanalista. Por isso o caminho do analisando é de dentro pra fora e só ele, com o auxílio de um bom analista, pode chegar à essência de seus problemas. 

A verdade é que nunca fomos educados para olharmos para nós mesmos e cuidarmos de nosso emocional. Com isso, formamos uma noção própria que em muitos casos não bate com a realidade.

Por isso, para quem estiver lendo este artigo, proponho que olhe para si com mais carinho e atenção. Você é muito importante para ser deixado de lado. Cuide de si para poder cuidar de quem você ama, só assim você vai aprender o sentido da TUA vida. 

E para não dizer que não citei Nietzsche... "Ouse conhecer a ti mesmo".

Até breve!

7 comentários:

  1. Eu ousei a me conhecer, e cada dia tem sido uma viagem única!! 💫

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  2. Qto unir a libido o eu e o ego . E assim esmiúça los a fim de encontrar o fio ou dobra da mácula e seu causador é um processo cuidadoso pq nem sempre tudo está ou não interligado. Remedios ou religião? Impotência/ frustrações e demais assuntos pertinentes devem permear fatores externos qto internos do ser.
    Prof: Filosofia

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    1. Caro Prof. de Filosofia, agradeço por seu comentário!

      O processo de olhar para si é delicado pois na maioria dos casos as pessoas, em suas pré concepções de si, tem em sua autoimagem um conceito muito aquém do que é de fato.

      É como se olhassem em um espelho que reflete sua imagem destorcida e dificilmente conseguem sozinhas sair deste círculo vicioso.

      A necessidade de ter um profissional capacitado ao seu lado é de fundamental importância.

      Dia desses, em uma extensa conversa com uma pessoa que me é muito cara, debatemos a essência desta problemática à luz da Filosofia e da Psicanálise e o quanto a união destas duas áreas de conhecimento é de fundamental importância para o ser, para o seu desenvolvimento e possivel cura de seus traumas, ou como vc mesmo afirmou em seu comentário.. "achar um possível fio da meada".. para iniciar o processo.

      Percebo que o mais importante em tudo isso, é a pessoa se abrir para si mesma no intuito de aliviar suas dores e angústias. A partir deste primeiro passo, tudo se transforma!!

      Grata por sua contribuição nobre Professor! Volte sempre!

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  3. Estimada psicanalista, entendo a necessidade de pessoas não só capacitadas mas que possuem além disto uma vontade humana desconhecida por muitos ( humanite), desrtarte, as palavras ou conceitos chaves resultados por mim não obdecem uma lógica universal embora a scintia assim o faz ao analisar e promover o conhecimento. Observe, portanto que como bem sabe cada caso é único e por ventura ou acaso de cronos , graças a sua mãe, deve se atentar se ao longo dos diálogos extrair conforme seu terreno elementos que por muitos algures materiais ou não, nem sempre estão concaternados, então, práxis e observações fazem de meros ajudantes, pessoas exímios qto sua nobre profissão. O todo pela parte a parte pelo todo, nem sempre resolverá situações que carecem um tato uno e divisível do Ser. Note transcendência será haverá não importa por mais que esqueçamos, um Deus ou um demonio, a lux ou trevas derivam de muitas informações, estas como a scientia, são guardadas como segredos de seus senhores. Ademais. Dizem que muita lux cega mais que as profundeza do abismo, liberdade neste caminho chamado sopro de vida se faz e desfaz tudo o que sentimos e tocamos mas matéria e espírito são totalmente diferentes. Sartre em alusão em seu artifício como exemplo corta papel nos inclina para uma reflexão inerente a existência. O criador, a criatura. Scintia e transcendência podem unir se sem especulações vazias ou rusgas pq, a idade moderna palco de especializações defronte a evolução mesclada com o poder, ignora seu agente campo para a ética chamada a resolver ou tentar, não obstante posterior na contemporânea idade por mais racional fossemos mais intolerância produzimos em vários campos a humanidade padece sempre como um todo. Assim o mestre dos mestres humanos de carne com poderes ultrahumanos não passará de mero mortal diante um lapso que quer a imortalidade em detrimento a tudo. Essa maneira nem a scientia pura e prodigiosa resolvem em tese questões humanitárias. Instituições milenares talvz o fazem. De fato a passos miúdos a maior parte do homem caminham na ignorância e soberba de poucos que pensam ter poder. Só há dois caminhos neste caso. A cura e a dor. A vida é a morte.
    Grato por despertar algumas reflexões em um mortal. As vzs é muito bom ser comun.

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    1. Caro mortal, estamos no mesmo patamar..

      Muito nobre sua explanação.

      Dentro da psicanálise, o mote central é aliviar a dor emocional do analisando, ou seja, por meio da fala ele vai trazendo à tona suas questões, ele passa a se ouvir, com isso sua reflexão pessoal vai tomando forma. A consequência direta dessa ação é uma mudança de comportamento, que a princípio é sutil mas real.

      A essência aqui é trazer o sujeito para si, de forma que ele exista de fato e aceite seus limites e perceba até onde pode chegar, ou seja, ele visualiza seu potencial.

      No que tange seu papel em sociedade, essa pessoa agirá de forma mais racional, consciente e se o bom comportamento não for por amor ao próximo, será ao menos por auto preservação.

      Então sim, palavras são importantes, diálogos são necessários e ouvir-se é de fundamental importância. A escolha está nas pessoas, cabe a cada um ter noção de como usá-las.

      Grata por sua contribuição!

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  4. A palavra tbm cura.
    A palavra tbm mata.
    A palavra tbm profetiza.
    A palavra tbm escravisa.
    Mas o silêncio é inigma.
    (Só quem conhece uma criança saberá dela qdo ela não fala).

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    1. Dualidade da palavra versus grandiosidade do silêncio..
      Muito bom!!!

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